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quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Sabedoria das estiagens


    

   As estiagens, há cada década, abatem-se sobre o meio colonial, quando as colheitas mostram-se escassas. Os animais e homens sofrem a falta de grãos, enquanto culturas ostentam-se miúdas e raquíticas. A falta de chuvas diminui os reservatórios da água e resseca o solo, quando o cenário rural assume ares de desolação. Os humanos, há cada dia, elevam os olhos ao céu, no que a decepção abate-se no contexto natural. As conversas generalizam-se sobre as condições meteorológicas, quando cada prenúncio de precipitação torna-se sinal de esperança. Os produtores nunca podem perder as esperanças, caso contrário, desistiriam da atividade econômica.
    Uma ou duas estiagens, há cada dez anos, ocorrem nos espaços regionais, no que o colono precisa “pagar para produzir”. A situação obriga a comprar trato com vistas de manter o plantel, pois como vacas e porcos, custam a constituir. As rações cedo sobem as alturas no comércio, enquanto os preços da produção custam a elevar-se nas cidades. Alguém “precisa marchar” com o prejuízo, que costuma recair, em função do baixo poder de barganha, sobre o colonial. Este queima parte dos esparsos dividendos acumulados nos períodos de maior produção. O produtor conhece a velha lógica da oferta e da procura: excesso de produção – preços baixos; ausência de produção – preços elevados.
     A realidade, no meio rural, criou duas velhas sabedorias. A primeira reza: o excesso de produção nas colônias mostra-se tão prejudicial como a ausência. Os produtores precisam receber os valores baixos dos atravessadores. A ausência de produção não tem o que comercializar e força a importação. A segunda versa: os efeitos da seca advêm um ano depois! A falta de reserva de grãos eleva o preço da carne às alturas.
     Estoques baixos obrigam a importação de cereais, quando labuta-se com baixos níveis nos plantéis e no vermelho na manutenção destes. Procura-se, nestas situações, “extrair água de pedras” no que os recursos das propriedades são exauridas ao extremo. Administrar uma propriedade da agricultura familiar de subsistência exige conhecimentos e habilidades econômico-financeiras, que é realidade de economista.
    Colono costumeiramente ostenta-se deveras econômico e poupador, quando pouco conta em valores monetários o preço da sua mão de obra. Aprendeu, nas experiências da tradição familiar do manejo da terra, não ser fácil constituir-se colono em paragens brasileiras, quando a oscilação/instabilidade econômica mostra-se frequente.



Guido Lang
Livro "Histórias das Colônias"
(Literatura Colonial Teuto-brasileira)

Crédito da imagem: http://blogs.diariodepernambuco.com.br/politica/?tag=seca 

Escambo de favores



Um certo colono criou um excepcional porco que fazia o capricho da propriedade. Este foi criado e engordado para um evento especial, quando os familiares advindos das cidades pudessem desfrutar um apetitoso assado.
Os dias transcorreram e a data achegou-se! O bicho, sem dó e piedade, precisou pagar com a vida o ônus do lazer alheio. Procurou, na hora do sacrifício, chorar numa aparência de criança, porém de nada adiantou diante dos propósitos humanos. O animal esquartejado procurou ressarcir o criador dos dispêndios do trato e trabalho, que fizeram necessários por meses e “doeram no bolso” com as rações.
Um momento, com vistas de haver cortesias recebidas, foi de devolver banhas, carnes e torresmos a vizinhança. Eles, numa ocasião, tinham abatido “alguma vítima”, quando, como bons próximos, “fizeram o agrado de dar um tira-gosto”. Uns vizinhos ganharam uns poucos quilos, quando seria uma inconveniência estocar todo o produto nos artefatos de refrigeração. “Uma mão lava a outra” e “outras mãos lavam muitas outras”, ou melhor, favores angariam a consideração e simpatia alheia. Um bom vizinho ostenta-se uma dádiva, porque emergências e necessidades nunca faltam nesta vida.
O criador/abatedor, na hora de selecionar a divisão dos produtos, manteve um singelo cuidado: retribuir artigos de qualidade, porém cada coisa uma parte. O melhor das carnes todavia resguardou  ao evento familiar; genros e noras adviriam da cidade para uma ceia excepcional. Eles daí poderiam degustar o apetitoso e cheiroso assado de porco. Procurou-se esta postura e todos ficaram muitíssimos alegres; o cuidado do porco custeou o ônus.
O idêntico, de alguma forma, aplica-se a conquista do poder, quando candidatos obrigam-se a pagar promessas. O erário mostra ser o porco; o vencedor da majoritária: o criador. A vizinhança: os apadrinhados pelos cargos. O cuidado maior consiste em guardar o melhor, os assados, aos muito próximos da cúpula dos partidos coligados. A festança estende-se nos quatro anos de gestão, enquanto, no ínterim, cria-se “novos porcos” com os favores da máquina pública. Uns mordem a isca e entram no abatedouro, enquanto outros mostram-se ariscos e querem tomar as próprias rédeas.
Poucas realidades mostram-se unicamente novas debaixo deste Sol velho, no que no mais ostenta-se a velha rotina. O indivíduo com avançada idade pensa ter visto tudo, porém alguns poucos sucedidos novos ainda surpreendem.

Guido Lang
Livro "Histórias das Colônias"
(Literatura Colonial Teuto-brasileira)

 Crédito da imagem: http://www.chefnarede.com.br/receitas/pernil-de-porco/