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sábado, 1 de dezembro de 2012

As pérolas da providência


    Um viajante, num desses desertos abrasadores e arenosos das Arábias, tinha se perdido. Um lugar, sem avistar uma só habitação, caminhava-se semanas inteiras.
   Ele estando a morrer de fome e sede, descobriu enfim uma palmeira, à sombra da qual corria um regato de água fresca. Achou, numa extrema casualidade, também ao pé da árvore um saquinho.
  “Seja Deus louvado por tamanha graça! Alimento!” Exclamou o viajante, apalpando o achado. Podem talvez ser ervilhas, que me impedirão de morrer de fome. O extraviado, assim falando, abriu esfomeado o saquinho e exclamou desapontado:
    “Ah, meu Deus! São pérolas!” O desgarrado viajante ia morrer de fome, não obstante de estar de posse de afortunado tesouro. Elas, pelas contas do mercado, valiam fortunas. O infortunado, nesta aflição e desespero, orava com fervor. Eis, que de repente, apareceu um árabe sobre um camelo. Este caminhava a toda pressa, pois encontrava-se a procura do perdido. Contente de localizar e receber a devolução das suas pérolas, compadeceu-se do forasteiro. O árabe deu-lhe pão e frutas deliciosas. Este recuperado nas energias, fez o montar também sobre o animal. Tratou de levá-lo ao termo de sua viagem, sem que o viajante corresse maiores perigos.
   - Repare, disse o bondoso homem, que admiráveis são os meios de que se serve o Criador. Eu lamentava como uma grande desgraça a perda das minhas pérolas; todavia nada mais feliz podia acontecer. Deus assim o quis, para que eu obrigado a voltar, chegasse aqui a tempo de salvar-te. Deus, por meios de aparências bem singelas livra-nos dos flagelos. Ele costuma fechar uma porta e abre diversas outras (J. M. de Lacerda).

(Fonte: Terceiro Livro de Leitura, Petrópolis/RJ, Vozes, 34 ed., 1921)

Crédito da imagem: http://www.reflexoesevangelicas.com.br/2012/05/deserto-vazio-frieza-trilha-rumo-ao.html

O trabalho


Um trabalhador, ligado à faxina/limpeza, via inúmeros colegas no aparente ócio. Estes, enfurnados em computadores, livros e telefones, pareciam ostentar a maior folga e moleza. O fulano, nestas idas e vindas, pensou: “-Queria eu um trabalho desses? Veja os caras conversando e passeando e, no final do mês, ganham o dobro ou o triplo do que eu em salário. Quê ostentam diferente de mim? Quais as razões desse desnível social?”...
O cidadão, numa dessas conversas informais - “daquelas de jogar palavras ao vento” - comentou o tema (com os profissionais de área). Disse, na presença do grupo, aos colegas: “-Queria eu um trabalho desses de vocês? Ficar os dias sentados em frente aos computadores? Mexem só com dados/informações? O serviço público paga até para ler os diários/jornais (virtuais)! Coloca bênção e moleza nisso?” Um dito formado/profissional ouviu a ladainha e sentiu-se atingido na exposição. Aquela história de ter falado o assunto à pessoa imprópria! Ouviu o que nem imaginara ouvir!
O profissional, com dezenas de anos em bancos escolares e investimentos graúdos em formação, explanou-lhe: “-Como comparas o teu trabalho com o meu? O nível de exigências mostra-se bem diverso! O pessoal do setor trabalha com informações! A tua labuta consiste em limpezas. Pergunta-te o número de anos de estudo? Os reais investidos em formação? Os níveis de cobrança? Quantos cursos e palestras de complementação? O número de livros manejados? Conhecimentos de específicos de área/profissão? A dureza na efetuação do concurso público?” O camarada saiu constrangido da conversa! Melhor teria sido em ficar quieto! Difícil falar com os doutores sem ouvir uma série de argumentos!
Certas realidades nem adianta reclamar ou querer mudar! Prevalece à formação e pouco entra o mérito empírico do conhecimento. Aquele que almeja galgar postos obriga-se a investir em formação escolar. Prevalece, no mercado do serviço público, a formação externada em títulos. O indivíduo tem a tendência de achar o trabalho alheio mais fácil que o próprio. Cada labuta e tarefa com suas conveniências e inconveniências. O melhor consiste consorciar profissão com vocação. O ganho assume ares de brincadeira e passatempo!
Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano da Vida”

Crédito da imagem: http://hfmoveisplanejados.com.br/moveis-para-escritorio.html